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Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Seg | 31.03.25

Um momento muito especial de uma viagem a Paris

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No dia 7 de dezembro de 2001, eu fazia 20 anos, e o filme Le Fabuleux Destin d’Amélie Poulain estreava em Portugal.

Com 20 anos, passava por uma fase estranha da minha vida. Não lhe chamaria uma adolescência tardia, mas antes uma entrada na idade adulta confusa e vazia de objetivos.

Estudava Comunicação Social em Santarém, num curso de que gostava, mas que não me entusiasmava especialmente. Não tinha ninguém especial na minha vida além da minha melhor amiga, que sempre foi muito importante, mas uma amizade não podia colmatar todas as necessidades de um adulto em formação. Ela própria travava as suas lutas, provavelmente.

Lembro-me de me sentir muito sozinha, isolada e, sobretudo, sem qualquer propósito. Não havia absolutamente nada que me fizesse levantar da cama de manhã com vontade. Olhando para trás, talvez estivesse próxima da depressão, mas, na altura, não o saberia dizer.

Aos 16 anos, tinha vivido uma relação amorosa muito importante, que nunca cheguei a superar e que deixou um vazio emocional enorme na minha vida. Nunca mais me tinha apaixonado por nada: nem pelos estudos, nem por uma pessoa. Não tinha passatempos, um desporto, um interesse especial (além de escrever), não tinha um porto seguro, não me sentia bem em casa, não tinha para onde ir e, eventualmente, refugiava-me na Internet, no MIRC, que era popular na época. Apesar de as coisas não serem tão más como agora, já naquela altura havia uma certa sombra a pairar sobre a Internet. Passava horas nas salas de chat a falar com pessoas aleatórias, muitas vezes pela noite dentro, dormindo apenas algumas horas de manhã.

Olhando para trás, acho que essa foi a pior fase da minha vida. Não tinha qualquer perspetiva de futuro. Detestava a vila onde vivia, não me identificava com nada nem com ninguém e sentia-me absurdamente vazia.

Mas, nessa altura — não sei se no dia dos meus anos ou pouco depois —, fui com a minha amiga ao cinema em Santarém. Não tínhamos nada planeado e, por acaso, acabámos por ver Le Fabuleux Destin d’Amélie Poulain, sem saber minimamente do que se tratava.

Essa foi a primeira de muitas vezes que vi o filme e, se pensar bem nisso, talvez tenha sido uma boia de salvação para a minha mente. Achei-o belíssimo, poético, com uma banda sonora perfeita. Deu-me esperança. A arte, traduzida em música e num guião magnificamente adaptado e interpretado, fez-me ver a beleza do mundo e perceber que valia a pena existir para poder pensar e viver a arte.

Por isso, na viagem que fiz recentemente a Paris, senti uma emoção especial ao entrar no Café des Deux Moulins, cenário principal do filme. Apesar de estar mal explorado em termos de limpeza e ambiente, tem muitas alusões ao filme, e estar ali foi profundamente emocionante e simbólico. Foi como a materialização de uma ideia que, há tantos anos, me mostrou a beleza do mundo.

Foi ainda mais especial estar ali com as pessoas mais importantes da minha vida. Quem sabe se o filme não foi um fator decisivo no desenrolar da minha vida e da minha personalidade a partir dos meus 20 anos? Talvez tenha sido. E há algo de profundamente bonito no facto de estar ali, agora, com a minha família — que só existe porque, no meio de um grande vazio existencial, fui capaz de acreditar que o mundo era bonito. Tudo porque um grupo de pessoas se reuniu em Paris para criar uma belíssima obra de arte.

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