Educo os meus filhos para serem diferentes
Quando andava na escola da vila onde nasci, e até ao 10.º ano, quando fui para uma escola maior, sempre me senti muito diferente e desenquadrada.
Ou porque era mais baixinha do que todas as raparigas da turma, ou porque me vestia muito mal, ou porque era extremamente tímida, porque não tinha tema de conversa com as outras raparigas, porque falava de coisas estranhas, porque não tinha interesses ou não os sabia mostrar, porque não tinha atividades fora da escola, porque não havia nada de especial em mim ou na minha personalidade, nem sequer algo semelhante aos outros.
Passei boa parte dos intervalos escondida na casa de banho porque, simplesmente, estava demasiado assustada para enfrentar as outras pessoas.
Podia pensar que o meu trauma foi causado por não ter o que os outros tinham, por ter entrado na escola apenas para a 1.ª classe e não antes, por não ter tido uma educação típica, ou por não ter tido as oportunidades que outros tinham. Não sei bem. Nem sei se interessa muito saber. O que sei, com toda a certeza, é que não quero que os meus filhos passem pelo mesmo que eu. Toda a minha infância foi marcada por uma sensação constante de solidão, angústia e muita insegurança. Estava segura — tinha teto, comida e cuidados básicos — mas a sensação era de muita insegurança. Eram outros tempos, e os nossos pais tinham outras preocupações, bem diferentes daquilo que hoje se considera importante na educação de uma criança.
Por me ter sentido sempre tão diferente dos outros (e não era no bom sentido), não quero que os meus filhos passem pelo mesmo. Mas também não quero que sejam iguais aos outros. Quero que se sintam sempre confortáveis com o que são. Se isso significar que são muito parecidos com a maioria, está tudo bem. Se forem diferentes, está tudo bem também.
Por isso, desde pequenos, faço por educar os meus filhos para a diferença e para o valor igual. Eles sabem que não são piores que os outros. Nem melhores. São diferentes, e somos todos.
Neste sentido, tento que não se metam com ninguém por ser diferente, e que nunca se importem com as pessoas que se metem com eles pelo mesmo motivo.
A Lara já foi gozada por vários motivos. Um colega chamou-a de pobre. Uma colega gozou com ela por ter sapatos velhos, outra por lavar os dentes, outros por ser baixinha. Se, no início, isso a incomodou, agora, com 10 anos, parece ser-lhe mais ou menos indiferente. Continua a usar sapatos velhos (exceto quando são novos), gosta de vestir roupa dos Pokémon, não tem um smartphone e não tem brinquedos novos todos os dias, nem nada que se pareça. Também já foi gozada pelo lanche que levava, apelidado de "uma porcaria" pelos amigos que levam bolachas recheadas de chocolate e gomas para comer.
Vou-lhe explicando, várias vezes ao longo dos anos, porque é que faço as escolhas que faço para ela, e tento adaptá-las de acordo com o que a Lara me vai dizendo e sentindo. Faço isso porque, mais do que criar pessoas que se esforçam demasiado para encaixar num grupo, quero muito criar pessoas resilientes, que sabem quem são e se sentem confortáveis com o que são, sem terem qualquer necessidade de se moldar à norma.
Por enquanto, com a Lara, parece estar a correr bem. Claro que não posso ter a certeza, mas as vezes que chegou a casa a chorar por ter sido gozada contam-se pelos dedos de uma mão, e nenhuma delas a impediu de ir à escola e encarar a situação de forma diferente nas vezes seguintes.
Acredito que eles saberão que o seu valor depende da forma como se comportam consigo mesmos, com o mundo e com os outros. Nunca dependerá da roupa que vestem, das suas posses ou da conta bancária. E desejo, acima de tudo, que muitas crianças possam ser educadas da mesma forma, porque tenho a convicção de que isso as ajudará a construir relações mais saudáveis, e, acima de tudo, a serem mais felizes e solidárias.