Dom | 10.04.16
Como perturbar um budista
O meu namorado é a personificação da tranquilidade budista.
Aparentemente nada o perturba o que, confesso, às vezes me irrita um bocadinho.
Eu, que tenho que batalhar tanto e todos os dias para manter a compostura e não ceder às picadas trocistas e insistentes das emoções, que tiro cursos de budismo e psicologia positiva online (sugeridos pelo meu pacífico companheiro) para tentar encarar a realidade de uma perspetiva racional e controlar a parafernália de pensamentos hiperativos que pululam na minha mente a cada instante, eu partilho a cama e a mesa (e o chuveiro) com uma autêntica réplica de buda.
O mundo pode estar a desabar e o Milton estará a relaxar numa esplanada à beira mar, com um cigarro numa mão e uma cerveja fresca na outra. Ou então a dormitar num sofá confortável.
Numa tarde dessas ocorreu irmos trocar umas coisas à sportzone. Na fila para a caixa o Milton tirou o telemóvel do bolso e, antes de percebermos o que tinha acontecido, o iPhone 6 no chão, o ecrã para cima, enfeitado com uns raios assimétricos brancos, que eu acreditei por segundos serem pó ou pelos de gato. Acho que ele também pensou o mesmo porque mantinha a calma do costume.
Ao pegar nele o choque: o ecrã todo esfanicado.
Olhei para ele.Pálido.Quase verde.Pensei que ia cair para o lado, que ia ter um ataque, que ia desmaiar.Aquilo sim, era estar perturbado. E muito.
Mais tarde ele explica-me que teve a sensação de lhe terem arrancado um braço. Caramba! Nem eu me sinto assim quando me enervo.
O iPhone, é uma das principais ferramentas de trabalho do Milton mas é mais do que isso: é como uma extensão dele próprio. Creio que sente verdadeiro afeto pela coisa.
Felizmente estávamos em Lisboa e pudemos ir arranjá-lo ao parque das nações, mesmo antes de irmos para o aeroporto.
Apesar dos 160€ de conserto, tivemos sorte. O ecrã ficou com garantia de 10 anos em caso de defeito e o Milton jura que este ecrã é muito melhor que o antigo. Fomos aqui.
Para melhorar tudo, o serviço foi muito bom. O rapaz que mos atendeu estimou uma hora para trocar o ecrã. Mostramo-nos apreensivos porque tinhamos que estar no aeroporto numa hora e pouco.
Ele disse que apesar do estimado ser uma hora, ligava para o meu telemóvel se conseguissem antes. Em meia hora o telemóvel estava pronto. Isso é que é fazer uma boa gestão das expetativas do cliente.
Em suma, apesar de tudo, viemos para casa todos contentes e o Milton regressou aos Açores com a carteira mais leve mas com a tranquilidade do costume e, quiçá, meio atordoado pela positiva com o seu ecrã novo e brilhante como nenhum outro.