A aldeia dos meus avós
O Casal de São Brás, em Ansião, a aldeia onde os meus avós maternos, Joaquim e Maria Joaquina Dias, viveram, foi um dos lugares mais marcantes da minha infância.
No Casal de São Brás, desfrutei de aventuras reais e imaginárias com os meus primos mais próximos em idade, percorrendo caminhos ladeados por árvores de todas as espécies e arbustos carregados de amoras pretas. Os muros de rocha delineavam os trilhos, e não muito longe, encontrávamos uma lagoa habitada por rãs, um destino frequente das nossas explorações.
A aldeia abriga uma Capela encantadora, onde todos os eventos importantes aconteciam, desde os primeiros namoricos até às festas populares, com fogueiras, carne assada e bailes, onde eu costumava dançar com o meu pai.
Na adolescência, eu e as minhas duas primas, dois anos mais novas, percorríamos alguns quilómetros do caminho deserto até à vila de Ansião, por vezes de madrugada, após sair do bar mais popular entre os jovens (cujo nome já se perdeu na memória). Não passava um único carro e não havia uma única casa durante longos 20 minutos, mas na altura, o nosso único medo era de encontrar um fantasma ou algo assim. Ainda hoje não sei se os tempos eram mais perigosos ou se a nossa inocência nos protegia dos medos que deveríamos ter. De qualquer forma, tudo correu sempre bem, e com sorte, chegávamos a tempo de apanhar o saco de pão fresco que o padeiro já havia deixado pendurado na porta.
Uma das memórias mais vívidas que guardo daquela época na aldeia dos meus avós é do pão de Ansião, o melhor que já comi, seja com margarina ou com os deliciosos queijos de cabra caseiros que a minha avó costumava ter e oferecer aos filhos, um de cada vez, para levarem para casa.
Recordo-me também do calor da lareira aceso na cozinha, para afugentar o frio do rigoroso inverno que ali se fazia sentir, do alvoroço das refeições, sempre com muita gente à mesa, o que me agradava especialmente. Lembro-me de irmos apanhar amoras para fazer piqueniques na sala e da minha prima Joana comer metade delas pelo caminho.
Gostava também de me inspirar nas fissuras no cimento da eira, onde se debulhava o milho ou se realizavam outras tarefas agrícolas, para inventar histórias de terror que contava aos meus primos mais novos, que hoje têm 30 anos e ainda se recordam disso.
Ansião foi uma das partes mais bonitas e interessantes da minha infância. Era onde havia mais gente, mais vida, mais aventuras. Foi lá que encontrei as primeiras pessoas dispostas a ouvir as minhas histórias: os meus primos, todos mais novos e cheios de uma curiosidade que alimentava a minha imaginação de forma única. Hoje, gostaria de resgatar pelo menos 10% daquela vontade de contar histórias às crianças. Os meus filhos agradeceriam.