De manhã, como de costume, ficamos sempre à espera de alguém. Nesse dia, estavam todos no carro, de cintos postos e prontos para sair, quando a Maria se lembrou de qualquer coisa que tinha de ir buscar ao seu quarto.
Longos minutos depois, quando ela entra no carro, diz-lhe o Eduardo:
Hoje trago-vos uma das minhas receitas favoritas dos últimos tempos.
O que mais aprecio nela é a sua simplicidade — dificilmente consigo imaginar algo mais fácil e rápido de preparar. Além disso, estas bolachinhas são saborosas e até saudáveis, considerando que o único ingrediente menos inocente é o açúcar mascavado, utilizado em quantidade moderada.
Espero que gostem tanto como eu.
Ingredientes:
400 g de nozes
3 ovos
150 g de açúcar mascavado
Preparação:
Pré-aqueçe o forno a 180°C.
Tritura as nozes até obter uma textura fina.
Adiciona os ovos e o açúcar mascavado às nozes trituradas e mistura bem, com uma colher ou na Bimby.
Dispõe pequenas porções da massa num tabuleiro forrado com papel vegetal.
Leva ao forno durante cerca de 15 minutos, ou até os bolinhos ficarem dourados.
Demorei meses a ler Anna Karenina. Não por falta de interesse—pelo contrário. Mas tenho o hábito de ler vários livros ao mesmo tempo, e este, com a sua densidade e profundidade, exigia outro tipo de atenção. Não era um livro para ser devorado, mas para ser vivido, absorvido, sentido. Havia páginas que me obrigavam a parar, refletir, voltar atrás e reler um parágrafo que, com uma simplicidade enganadora, desmontava a complexidade da alma humana.
Se Tolstói tem um talento inegável, é o de explorar a essência das nossas emoções mais íntimas. Anna Karenina não é apenas uma história de amor, traição e tragédia; é um mergulho profundo na mente das personagens, revelando os seus dilemas, contradições e fragilidades com uma precisão quase cirúrgica. Há momentos em que sentimos que o autor nos observa, que compreende os nossos próprios medos e hesitações melhor do que nós mesmos.
A riqueza das personagens foi um dos aspetos que mais me fascinou. Não há heróis nem vilões, apenas pessoas profundamente humanas, com todas as suas imperfeições. Anna não é apenas uma mulher apaixonada e transgressora—é uma alma dilacerada entre o desejo e a culpa, entre a liberdade e a solidão. Levin, por sua vez, com a sua busca incessante por um sentido para a vida, reflete as nossas próprias inquietações existenciais. Em cada figura que habita este romance, há algo de universal, algo que nos obriga a confrontar a nossa própria condição.
E depois há o retrato da aristocracia russa, desenhado com um detalhe impressionante. Tolstói não se limita a mostrar o século XIX—ele transporta-nos para dentro desse mundo, onde as aparências pesam mais do que a verdade, onde as convenções sociais se sobrepõem à felicidade individual.
Ler Anna Karenina é um exercício de reflexão sobre a fragilidade da natureza humana. Não é apenas um romance clássico, não é apenas uma história brilhantemente construída—é uma experiência transformadora. Um livro que nos molda, que nos obriga a olhar para dentro e a repensar o que julgávamos saber sobre o amor, a mente humana e a própria existência.
Estávamos os três na cozinha: eu, o Eduardo e a Lara. Tinha acabado de estudar com a Lara sobre a formação de Portugal, quando o Eduardo, curioso como sempre, fez uma pergunta qualquer.
Respondi sem pensar muito:
— Eduardo, Portugal existe porque D. Afonso Henriques brigou com a mãe.
Ele franziu a testa, pensou um pouco e, com toda a seriedade, concluiu:
— Então isso quer dizer que foram os dois para o gabinete.
Claramente estava a lembrar-se do que acontece na escola quando alguém briga… e a tentar encaixar essa lógica na História de Portugal!
Quando era pequena, antes de entrar para a escola primária, tinha uma “ama”, que era, na verdade, uma vizinha que não trabalhava e tomava conta da sua neta, que tinha a mesma idade que eu. Quando me lembrava dela, costumava pensar que não era muito simpática, porque ajudava a neta a ganhar-me em jogos de cartas e, em conversa com outras vizinhas, comentava — mesmo à minha frente — que eu era uma “Maria Rapaz”: muito irrequieta e sempre toda suja de andar a trepar árvores e brincar com terra.
Em contraste, a sua neta (minha grande amiga e uma menina muito querida, de quem gostava muito) era, nas palavras daquelas adultas, “uma mulherzinha muito atinada e sempre impecável”. Recordo que tínhamos 5 anos.
Hoje, por algum motivo, lembrei-me dessa senhora que tomava conta de mim e consigo recordar claramente a sua voz. Curiosamente, lembro-me com carinho dos momentos que passei na sua casa. Apesar de nunca ter sido muito carinhosa comigo, não me lembro de alguma vez me ter batido ou gritado. Ensinou-me a fazer renda, deixava-me fazer pequenas bolinhas de pão caseiro com a sua neta sempre que cozia pão e, quando eu já tinha 10 anos e ela tinha um segundo neto bebé, deixava-me andar com ele ao colo para todo o lado, contar-lhe histórias e brincar com ele a toda a hora. Isso despertou em mim, pela primeira vez, uma amostra do que seria o amor maternal.
Afinal, foi ótimo ter tido aquela ama, e sinto-me verdadeiramente feliz, hoje, por me lembrar da sua voz e dos momentos felizes que passei na sua casa, apesar dos menos bons. E, embora este sentimento tenha surgido espontaneamente, creio que tentar resgatar na memória o bem que alguém nos fez pode ser um exercício muito valioso quando as desilusões e os conflitos começam a afastar-nos das pessoas.
Ao longo dos meus 43 anos de vida, sempre tive a sorte de nunca me faltar o essencial. Nunca passei dificuldades em termos materiais e, acima de tudo, sempre tive comida na mesa. Contudo, desde pequena, aprendi um valor fundamental: a importância de não desperdiçar alimentos. Creio que isso se deve ao fato de ter sido criada pela minha avó, uma mulher simples e amorosa, que começou a trabalhar ainda criança, durante a ditadura, e que viveu de perto as dificuldades da escassez. Cresci com a consciência de que, enquanto nunca me faltou nada, há muitas pessoas que não têm o que comer. E é por isso que me incomoda profundamente ver comida boa sendo desperdiçada.
E tento passar este valor do "não desperdício" aos meus filhos.
Recentemente, após um almoço que provavelmente consistiu em sobras de outros dias, a Maria, com apenas 8 anos, me fez uma pergunta muito genuína: "Mãe, não podemos dar os restos de comida aos pobres?" A sua questão partiu de uma preocupação pura e direta, fruto do que sempre lhe ensinei: que não devemos desperdiçar nada.
Aproveitei a oportunidade para explicar-lhe que, embora aquele alimento fosse fruto das sobras, já não estava em condições de ser consumido. A comida já não estava fresca, e por isso não poderíamos dá-la a ninguém, pois acredito que não devemos oferecer a outra pessoa algo que não fosse bom para nós. Todos merecem o mesmo respeito e consideração.
Expliquei-lhe que podemos, sim, doar aquilo que já não usamos, mas sempre em boas condições: roupas que já não servem ou que não gostamos mais, brinquedos que já não utilizamos. No entanto, nunca devemos dar algo estragado ou que não tenha utilidade.
Claro que, ao longo da minha vida, não posso dizer que sempre fui impecável nas minhas doações. Algumas vezes, certamente, cometi erros. Mas, com o tempo, essas convicções foram se tornando mais firmes, e hoje faço questão de ensinar aos meus filhos da forma que acredito ser a mais humana e correta.