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Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Sab | 12.02.22

Sobre um rapaz, sobre bullying e sobre todos nós


A minha filha de 7 anos contou-me que um dia, umas meninas na escola gozaram com os sapatos dela, porque estavam velhos e gastos.

Ontem, contou-me que, enquanto varria do chão da escola algo que tinha sujado, um menino passou e riu-se dela enquanto a chamava de varredora (isto é mesmo um insulto?!!!)

Um dia, no aniversário de um amiguinho, a Lara, que na altura tinha 5 anos, estava a rir-se de outra menina, porque era mais gordinha.

Foram excelentes oportunidades de ensinar à minha filha alguma coisa sobre o respeito e a tolerância em relação aos outros.

Nos primeiros dois casos eu disse-lhe que não devia dar ouvidos a conversas idiotas e que, ter sapatos velhos (no caso particular dela) era sinónimo de uma infância feliz e um estilo de vida sustentável e minimalista, e varrer o chão era sinónimo de dignidade, responsabilidade e consciência. Disse-lhe, também, que talvez os meninos que gozaram com ela não tenham pais muito disponíveis para lhes explicarem as coisas ou que deviam estar muito tristes, porque pessoas felizes não chateiam ninguém (não me julguem, não sou perfeita!).

No terceiro caso, expliquei-lhe porque é que ela não quer estar na parte dos "idiotas" (desculpem-me novamente a falta de tato, não sou mesmo nada perfeita). Expliquei-lhe, como o faço muitas vezes quando chateia os irmãos, que a nossa tristeza não nos dá direito a causar sofrimento aos outros.

Na minha infância, passei muitos intervalos escondida na casa de banho, com medo dos outros meninos. Durante muito tempo, sentia-me aterrorizada sempre que caminhava pela escola. Sentia-me um alvo. Nunca me espancaram, mas levei alguns estalos e fui gozada muitas vezes: pela minha roupa, pelo meu jeito assustado, por ser mais pequenina, mais magra, por vestir rosa com vermelho, mas sobretudo porque era permitido que isso acontecesse. Professores e auxiliares nada faziam. Se alguma vez fui defendida por alguém, foi por outros miúdos, mais velhos, quando assistiam a algo.

O que vos posso dizer é que não sentia grande afeto pelas pessoas. Em geral. E tinha apenas 10 anos.

Na altura não existia Net, não existiam Redes Sociais, não existia tanta informação perturbadora disponível. Existiam livros na biblioteca e eles salvaram a minha sanidade mental. Tive sorte.

Por isso e não desculpando a opção violenta, tentemos não julgar demasiado rápido, como se alguém nascesse bom ou mau e a sociedade nada tivesse a dizer sobre o ambiente que cria para as nossas crianças e  jovens.

Sejamos honestos. Somos demasiado permissivos com idiotices. Somos, ainda hoje, em adultos, em ambiente laboral, nas lojas, nas ruas, no trânsito, nas festas e até nas famílias, demasiado permissivos com todo o tipo de abuso emocional provocado sobre os "diferentes", os "mais fracos", os "esquisitos".

Somos absurdamente tolerantes com idiotas que passam a vida a meter-se na vida dos outros, tecendo comentários pessoais, despropositados e ofensivos em público, humilhando gratuitamente alguém a troco de nada e nada tolerantes com coisas que não nos dizem respeito nenhum: como a roupa que cada um veste, os seus hábitos ou as suas opções pessoais.

Tornemos o mundo um local um pouco mais agradável para estar, cuidemos, desde cedo, da saúde mental das nossas crianças, e talvez passe a existir menos ódio nas mentes de pessoas tão jovens.