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Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Vinil e Purpurina

Parafernálias sobre a minha vida e a minha mente.

Qua | 30.09.20

A entrada para o 1º ano da escola primária

Nos anos 80

 

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Lembro-me vagamente do meu primeiro dia de escola. Lembro-me de estar num pavilhão grande cheio de pessoas, com a minha mãe, e a determinada altura chamarem o meu nome para me juntar a um grupo de crianças que seriam da minha turma.

Havia muitas crianças a chorar e eu não entendia porquê. 

Eu não chorava. Eu nem percebia bem o que estava a acontecer. Tinha 5 anos e não me recordo de me terem falado muito na escola. Não estava receosa nem entusiasmada. Não sabia bem ao que ia. Nunca tinha estado numa creche ou jardim de infância. Ficava com a minha bisavó ou uma ama que não era especialmente simpática.

Quando comecei a ficar sozinha na escola, surgiram mais sentimentos sobre a nova situação em que me encontrava. Pareceu-me logo tudo uma grande selva. Não me lembro das auxiliares ou professoras falarem especialmente comigo e sei que passava parte do tempo com medo de tudo e de todos. Não estava habituada a estar com muitas crianças e assustava-me facilmente. 

Não guardo memórias fantásticas da escola. Não até ao 10º ano, quando fui estudar para Almeirim.

Sou do tempo em que as turmas se dividiam da seguinte forma: os filhos de médicos, de advogados, de professores, de pessoas com cargos políticos e de detentores de algumas posses, ficavam numa turma com uma professora gentil. Os outros ficavam com as professoram que calhavam.

Sou do tempo em que uma professora espancava um miúdo e depois besuntava-o com álcool quando via que lhe tinha deixado muitas marcas no corpo, um bocado antes da hora de saída. 

Eu olhava para aquilo com incredulidade e, no intimo, desejava que existisse algures uma realidade um pouco diferente, e planeava mudar-me para lá logo que conseguisse ser independente.

A entrada na escola foi muito dura para mim. Havia bullying, havia problemas sociais, crianças muito problemáticas, filhos de pessoas com muitas carências materiais e psicológicas. Havia uma cultura de isolamento e pouca entre-ajuda entre as pessoas. Havia desinteresse dos professores e funcionários. Ninguém queria saber. Todas as semanas alguém partia a cabeça, ou por ter levado com uma pedra ou por outra coisa qualquer. Os miúdos brigavam com violência e aparentemente não aparecia ninguém.

A determinada altura, no 5º ou no 6º ano, comecei a lanchar na casa de banho porque me parecia ser o sítio mais seguro para o fazer. Tinha medo de estar com as outras crianças sem professores por perto.

Eu era boa aluna. Não tinha mais nada para fazer além de estudar, então estudava. Não era difícil ser boa aluna. 

Naqueles anos aprendi a ter medo de pessoas. Os meus primeiros 10 anos de escola não foram, portanto, fantásticos!

De maneira que o maior investimento da nossa família é a escola dos miúdos. Se calhar estou enganada e a minha escola é que era especialmente má. Seja como for, pago para não saber.

Neste momento não sinto qualquer tipo de mágoa em relação aos meus anos escolares na vila onde cresci. O facto é que ter crescido ali me deu uma boa base para que, a partir dali, tudo melhorasse. Acredito que também me deu uns salpicos sombrios à personalidade que me haviam de dar jeito uns anos mais tarde. 

Esta semana a Lara entrou na escola primária e... não houve grande emoção, tal como aconteceu comigo.

Na verdade, não existiram grandes mudanças. É a mesma escola onde a Lara entrou com 18 meses, os mesmos amigos, e a mesma vontade de ir para a escola. Sem nervosismo, sem stress, com a vontade de sempre. 

Hoje perguntei à Lara se queria que a fosse buscar mais cedo. A resposta é sempre a mesma. Não, obrigada. Que maravilha!